domingo, 11 de setembro de 2011

O Peso da Cruz


            Clic... clic...
            Clic...
            Coloco as balas na arma, meio sem jeito. Não consigo parar de lacrimejar, não dá pra ver nada. Merda. Não é hora de fraquejar. Já passei por tanta coisa, não posso desistir de fazer a única coisa que pode me salvar.
            Clic.
            A última. Não entendo por que coloquei todas as balas. Só pretendo usar uma. Talvez tenha sido para adiar o momento... Não, não. Deve haver outra explicação. Não estou fraquejando. NÃO ESTOU! Aperto a arma com força. Então é isso. Acabou. Conseguiram me vencer.
            Não escrevi carta alguma. Não acho que alguém queira ler uma despedida minha. Talvez só venham a saber da minha morte daqui a semanas, quando os vizinhos perceberem o cheiro e vierem ver o que aconteceu. Talvez não demorassem tanto a me notar se... Ah. Outra lágrima. Me recosto na parede do banheiro e me deixo cair sentado no piso. Sem camisa e descalço, a sensação de frio é ao mesmo tempo desagradável e bem vinda, por incrível que pareça.
            Acho que não era pra ser, mesmo. Nada deu certo. Nada dá certo. Será que algo vai dar certo? Não, sem sentimentalismo. Objetividade. Você é um homem objetivo. Faça agora! Aponto a arma para a testa.
            Na testa mesmo? Onde será que é melhor? Não sei bem qual a melhor opção. Será que não é muito violento? Será que não dói? Recosto a arma. Isso é ridículo. Eu não devia estar pensando tanto assim. É só fazer. Pronto. Nada de mais. Eu lutei e perdi, não há muito o que ser pensado.
            Me levanto. Lavo o rosto com a água fria da torneira. Estou tremendo. Merda, será que eu não sirvo nem pra isso? Olho pra meu reflexo no espelho. Não dá pra ver muito com a luz apagada, só um vulto pálido, mais pra lá do que pra cá. Patético. Sinto o peso da arma na mão e miro no espelho. O meu reflexo dá um sorriso discreto. Volto a arma para a testa, novamente.
            Toc toc.
            Ahn? Uma batida na porta do banheiro. Tem alguém em casa? Tem alguém na MINHA casa?! Era só o que faltava. Mais essa. Aperto a arma. Talvez tenha sido bom ter colocado mais de uma bala, afinal de contas. Abro a porta repentinamente. Uma luz forte quase me cega. Deixo cair a arma. E tão rápido quanto surgiu, a luz desaparece. No lugar da arma, jazem no chão um caderno e uma caneta. E eu escrevo. E escrevo...

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Não, não quero me matar. Tenho estado muito deprimido, mas escrever sempre foi uma boa maneira de raciocinar as ideias, repensar, dialogar comigo mesmo. Estou há semanas querendo escrever pra tentar me sentir melhor, mas não sai nada. Revirando as minhas pastas encontrei esse texto que escrevi há algum tempo, num momento de tristeza similar ao atual. Reli, adaptei, reorganizei, tirei partes, coloquei partes. Estou bloqueado para escrever, mas o simples fato de editar o texto já me ajudou um pouco. Parece besteira, mas estou me sentindo tão só que chega a doer... Esse negócio de ser gay faz encontrar um amor de verdade ser quase roteiro de filme, "Missão Impossível". Mas eu não desisto. Não me venceram ainda. Não conseguiram matar nem o meu eu lírico, quem dirá eu.

Um abraço a todos!
Nero

quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

Como (não) educar uma criança

Fiz esse texto numa redação de escola no ano passado. Vi algumas discussões sobre o assunto alguns dias atrás e desenterrei a redação. Acho que expliquei bem o meu ponto de vista, por isso vou colocá-la aqui.

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Imagine uma criança de seis anos sozinha na sala de casa. Curiosa, ela pega uma chave-de-fenda do pai numa gaveta e começa a tirar os parafusos de uma tomada. Nesse instante, chega seu pai. Agora, imagine dois desfechos para essa história: no primeiro, o pai grita com a criança e dá nela algumas palmadas; já no segundo, ele a chama e a explica o quanto é perigoso mexer com uma tomada, fazendo a criança jurar que nunca mais fará aquilo. O que essa criança aprendeu em cada caso?


Segundo a pesquisa Datafolha, em julho de 2010, o desfecho dessa história em 58% dos lares brasileiros seria o primeiro. A cultura de “educar” através de castigos corporais data de antes de inventarem as datas, e é muito aceita no Brasil. Por isso, quando o projeto de lei que proíbe esse método chegou ao Congresso Nacional, houve discussão e polêmica em todo o país.

Os seguidores desse método alegam que ele faz com que a criança aprenda a ter limites e a respeitar os pais. Curiosamente, a pesquisa Datafolha revela que, embora 72% dos entrevistados tenham apanhado dos pais na infância, apenas 58% repetem o tratamento com seus filhos. Isso quer dizer que nem todas as vítimas da palmada consideram que ela lhes fez bem, e se recusam a passar o método adiante.

Algumas pesquisas comportamentais, como a da Universidade de Tulane, nos Estados Unidos, descobriram que crianças que apanham dos pais tendem a se tornar mais violentas. O motivo é simples: voltemos à criança de nossa história. O que ela aprendeu no primeiro caso é que o mais forte pode e deve subjugar o mais fraco sem dar explicações, e que não há nada de errado com mexer na tomada, desde que o pai não descubra que isso aconteceu.

É por isso que há redes como a “Não bata, eduque”, que dão apoio ao projeto de lei em questão. Há uma oposição entre bater e educar. Agora, voltemos ao segundo desfecho: a criança cria com o pai uma relação de amor, e não de terror (os defensores da “palmadinha” usam frequentemente o eufemismo “respeito” no lugar de “terror”). Dessa vez, a criança foi educada. Entende o porquê de ser perigoso brincar com a tomada e tem no pai um confidente, alguém para quem fazer perguntas sem medo.

A “lei da palmadinha” enfrenta oposição de um grande número de pessoas. São brasileiros que não sabem o que é educar, impõem o terror nos filhos, permitem que eles aprendam tudo fora de casa e se revoltam ao vê-los rebeldes, desobedecendo aos pais às escondidas. “Onde foi que eu errei?”. Sem encontrar a resposta, os opositores da lei erram novamente ao permitir a propagação do erro...

sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

Nem tudo é homofobia...

Sou homossexual e tenho acompanhado as discussões sobre o PLC 122, a lei que criminaliza a homofobia, pois o assunto me interessa bastante (obviamente). Com a aprovação do projeto, torna-se crime cometer atos de preconceito contra pessoas LGBT, justamente o contrário do que ocorre atualmente, em que o preconceito é amplamente estimulado por várias pessoas e, principalmente, pela televisão.

O discurso de quem é contra o projeto normalmente aborda o fato de que pode haver abuso na lei. Sou obrigado a concordar. Já presenciei muitos absurdos nesse sentido, em comunidades sobre o assunto no Orkut, o que me deu vontade de fazer esse texto.

Ano passado, na época das eleições, passei por dois episódios. Vi, num tópico, uma notícia sobre uma travesti que foi votar toda vestida de mulher, e foi barrada pelo mesário. O que mais tinha no tópico era gente amaldiçoando o mesário, falando que era preconceito. Não me contive e postei dizendo que a função do mesário é ter certeza de que a pessoa que está votando é a portadora do documento, para que ela só vote uma vez e seja feita a democracia. O mesário se viu diante de uma pessoa que não tinha nada a ver com a foto no documento, e não fez mais que sua obrigação em impedi-la de votar. A partir daí, as maldições foram mais pra mim que pro pobre mesário.

Em outro tópico, dizia-se que o vice de José Serra declarou que não apoiaria os direitos dos homossexuais. Claro, milhões de maldições ao Serra. Também postei lá, dizendo que fiquei chateado de saber isso mas que mesmo assim votaria nele, pois o achava o melhor candidato. Ser gay é uma das minhas características, não quem eu sou. Me preocupo também com a economia, com política, com a sociedade. Aí começaram a me xingar pesado... Fui chamado até de homofóbico (hein?). No dia seguinte entrei no Orkut e vi que tinha sido expulso da comunidade.

Recentemente, vi outro tópico (mesmo expulso ainda dá pra ler). "Banda Restart declara: não somos gays". Nova enxurrada de reclamações. Basicamente, os membros da comunidade diziam que a banda depreciou os gays ao dizer isso, porque ficou parecendo que estavam negando um crime. Eu já vejo de outra forma... O Brasil inteiro tá perguntando pra banda sobre isso. Eles responderam, e daí? Eu postaria isso, se não tivesse sido banido.

Sou inteiramente a favor da aprovação do PLC 122, pois tenho certeza de que os prós superarão em muito os contras. Só espero, porém, que nós homossexuais amadureçamos nossa ideia de homofobia, para que não sejam feitas acusações injustas. Homofobia é agressão física ou verbal. É depreciação. É expulsar ou excluir. É coibir demonstrações de afeto.

Com os direitos vêm os deveres. Espero que nós, gays, saibamos lidar com os deveres, para merecermos os direitos que tanto desejamos.

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Músicas de qualidade


Músicas de qualidade

Tenho medo de estar me tornando uma pessoa que jurei que nunca ia me tornar: uma daquelas que falam “no meu tempo era melhor”. E olha que eu só tenho 18 anos. Parei de ouvir músicas no rádio porque acho que o que temos hoje, em geral, são músicas de péssima qualidade. Tenho saudades da época em que ligava o rádio e ouvia Red Hot Chili Peppers. Hoje é só Restart, Justin Bieber e Lady Gaga.

Claro que alguém vai dizer que gosto não se discute, que os tempos mudaram (18 anos e me sentindo um velho...), e que é preconceito meu falar que essas músicas não têm qualidade. Vou tentar, com toda a humildade, provar meu ponto de vista. Não sou nenhum especialista no assunto, então me desculpem qualquer erro.

Primeiro, alguns conceitos. Para mim, há três coisas importantes numa música: a parte instrumental, a estrutura da letra e a mensagem da letra. Se essas três coisas forem devidamente trabalhadas e coerentes umas com as outras, a música deixa de ser somente ouvida: passa a ser também sentida.

A parte instrumental tem um papel crucial na qualidade da música, e muitas vezes é pouco trabalhada. Essa parte indica o ritmo da letra e as emoções que estão sendo passadas. A parte instrumental é o que conecta o ouvinte à música pela alma, fazendo os dois “vibrarem na mesma frequência”.

O coração do ouvinte praticamente bate junto com os instrumentos e, assim, o ouvinte fica preparado para ouvir e interpretar a letra, pois ele está na “sintonia” em que a banda pretende que ele esteja. Em muitas músicas atuais a instrumentação é puro enfeite. Faz-se uma batida genérica que não muda durante toda a música (e é cansativa pra caramba...) ou coloca-se uma melodia que não condiz com a mensagem da letra, o que deixa a experiência musical toda confusa.

Para exemplificar, vou pegar duas músicas: “Just dance” e “Just dance”. Não, você não está vendo dobrado. Vou comparar uma música com ela mesma. A diferença é que uma é a versão original, da Lady Gaga (http://www.youtube.com/watch?v=2Abk1jAONjw), e a outra é um cover da banda Vanilla Sky (http://www.youtube.com/watch?v=xOeHeDgi4Qo). A estrutura e a mensagem da letra são rigorosamente as mesmas em ambas as músicas, evidente. A diferença é bem clara: na versão original a instrumentação não acompanha a letra. A letra é super animada, a instrumentação + entonação da cantora são quase neutros e o ritmo é o mesmo do começo ao fim, o que deixa a música extremamente estranha e cansativa.

A banda Vanilla Sky, a meu ver, consertou essa música. A instrumentação + entonação da banda são tão animadas e coerentes com a letra que eu sou incapaz de ouvir essa música sem dançar sentado na cadeira. Graças a essa coesão a música de Vanilla Sky é muito ouvida e muito sentida, sendo que a da Lady Gaga é muito mais ouvida que sentida. Por isso, acredito que o cover tenha qualidade muito superior à da música original.

(continua...)

quarta-feira, 5 de janeiro de 2011

O que estamos deixando pro futuro?


Na prova de redação do ITA, de 2009, foi colocada a charge acima. A minha escola, coincidentemente, nos propôs essa charge em uma prova de redação meses antes, com o seguinte tema:

"Quando deixaremos de pensar no mundo que deixaremos para nossos filhos e passaremos a pensar nos filhos que deixaremos pro mundo?"

A abordagem é muito relevante, e fiquei pensando sobre o assunto. As preocupações de hoje fingem ser sobre o meio-ambiente. É, não são. Quando falamos do fim do mundo estamos, egocentricamente, falando do fim da espécie humana.

Não há preocupação alguma com o planeta: há preocupação conosco. Volta então o questionamento: que pessoas deixaremos pro mundo?

O mundo de hoje é selvagem, capitalista, e todos são criados pra dar rasteiras nos outros assim que for possível, necessário e conveniente. É um mundo em que as crianças/adolescentes atuais já têm atitudes totalmente opostas à cidadania, ao respeito. É um mundo em que o "Eu sou importante e o resto que se exploda" é a mentalidade predominante. Um lugar em que o mal é vangloriado e o bem é punido.

O que estamos fazendo de bom com nossa vida? O que estamos fazendo por nós, humanos, como coletivo, sociedade? Quando conseguiremos acabar com esse egocentrismo doentio? Quem sabe um dia...

segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

Cidadania


                Certa vez estava na casa de um amigo. Ele estava jogando baralho online com outras três pessoas, e estávamos esperando uma tia dele chegar para nos levar ao centro espírita que frequentamos. Ela chegou e ele, no meio do jogo, fechou a janela. Chamei a sua atenção:

                _Como que você sai desse jeito? Nem avisou pras outras pessoas que tinha que sair!
                _Cara, é só um jogo! Não tem importância nenhuma!
                _Claro que tem! Você estava interagindo com três pessoas que, agora, tiveram que parar o jogo pra começar outro, com outra pessoa. Você estragou a diversão delas!
                _Ih, deixa de ser chato. Tô nem aí pra elas, nem conheço.

                Fiquei observando-o no centro, aquele dia. Rezando, entrando nos debates, falando sobre coisas boas. Fiquei pensando... De que será que adianta ir a um local religioso, de qualquer religião, e só dentro daquele local fazer o bem? De que adianta não aplicar nada daquilo na vida prática?

                Prestei vestibular na UFG em junho de 2009, pra treinar. Uma das questões da prova de biologia da segunda fase pedia para dar dois exemplos de coisas que poderiam, segundo o código internacional de cores da reciclagem, estar em latas de lixo azuis, amarelas, verdes, vermelhas e marrons. Fiz a questão rindo, impressionado que tivesse caído algo tão fácil na prova. O que me surpreendeu foi a repercussão da questão: altíssimos índices de erro. Eu estava na porta esperando minha mãe chegar e ouvindo o pessoal comentar: “verde é plástico, né?”. Tive uma discussão com um professor, que afirmava que a questão tinha que ser anulada. As pessoas preferem responder uma questão sobre nome e função de vinte enzimas a mostrar que podem ser cidadãs.

                É tão difícil assim se preocupar com o próximo? Tenho medo de pensar no número de pessoas que não está nem aí para a humanidade. Quantas seriam? 20%? Pouco... 40%? Ainda ta pouco... 80%? Assustador, mas ainda não ta legal... 99%? Pessimista, mas quem sabe, não é mesmo? Melhor não pensar nisso...

domingo, 2 de janeiro de 2011

Mudanças...

Um ano e meio atrás eu estava conversando com um amigo meu pelo MSN. Ele falava de uma garota que estava dando umas indiretas nele, e me mandou o registro da conversa pra eu “analisar”. Fiquei surpreso e logo mudei de assunto:

_Você guarda os registros?!
_Guardo.
_Manda o meu?

Ele mandou. Fiquei muito surpreso com o que vi. Era um log de 2004, sim, anos atrás. Anos que não são nada se comparados aos setenta que eu (acho que) vou viver. E o que vi foi uma pessoa completamente diferente da que sou hoje. Me vi pivetinho, com 11 anos. Completamente imaturo. Com filosofias ultrapassadas. Xingando bem mais que o necessário (sim, pois xingar é necessário). Vi que era muito chato. Vi que mandava links de cinco em cinco minutos pra ele e ficava perguntando "Já viu? Já viu?". Vi que nossas conversas se resumiam a falar palavrão, falar de anime, falar de besteira e falar mal de uma professora de história da qual nunca gostamos.

Não pude conter as lágrimas em determinadas passagens. Algumas horríveis, comigo falando coisas horríveis. Outras fantásticas. Me vi combinando de ir a determinados lugares, dias de planejamento. Me via comentando depois como tinha sido. Fiquei muito emocionado.

Esse meu amigo me disse que guarda os registros porque são muito mais fiéis aos fatos que nossa memória imperfeita. Já tem um ano e meio e, desde então, guardo os registros de conversação, para que possa olhar pra eles daqui a uns anos e ver como tudo mudou. Eu mudei muito, e ainda mudarei. Fica aí o relato da minha experiência. Sugiro que você, que está lendo, faça o mesmo, pois vale muito a pena.